Há Camões, Justin Adams e Desamor no novo fado de Lina.

Há três anos a fadista Lina, na companhia do produtor e músico Raül Refree, surpreendeu o mundo com um álbum arrojado e celebrado em todos os quadrantes, à volta do repertório de Amália.

Agora, eis que regressa, ainda mais poderosa, não só na voz inconfundível mas também na composição de algumas canções, na companhia do produtor e músico britânico Justin Adams, reunidos à volta da poesia de Luís de Camões, no ano em que se celebra o seu quinto centenário.

Para já haverá o single “Desamor” e, no início de 2024, o novo álbum que, de forma esclarecedora, receberá o título de “Fado Camões”.

A nova canção traça bem o renovado trajeto de Lina, numa lógica onde a familiaridade e a novidade andam a par. Reconhecemos alguns traços que fascinavam no anterior registo, como a elegância despojada, mas depois existe uma espacialidade e um lugar de respiração entre voz, piano, guitarra e quase silêncio, que criam outros cenários, com a dor, justeza e dignidade, a par.

“É uma canção que fala sobre os amores de infância”, reflecte Lina. “O poeta quer que uma criança consiga entender o poema e por isso coloca-o na boca de uma menina. E por esse poema ter essa caracteristica, em estúdio, quis que existissem momentos sonoros, no início, com uma proximidade ao som da caixa-de-música, remetendo para um certo universo infantil ou que nos pode evocar os amores de infância.”

Em “Fado Camões”, abre-se um novo capítulo na carreira de Lina, com Justin Adams, conhecido músico, compositor e produtor britânico, cúmplice de Robert Plant e da sua banda, e responsável pela produção de álbuns de Robert Plant, Rachid Taha, Tinariwen, Jah Wooble ou mais recentemente de Souad Massi, para além de colaborações com Brian Eno, Sinead O’ Connor e diversos músicos árabes e africanos, como aconteceu com o músico Juldeh Camara da Gâmbia.

Na maior parte dos projectos onde se envolveu existiu sempre essa ideia de partir de estruturas sólidas, linguagens enraizadas na tradição, sejam blues, folk ou alguma música africana, e atribuir-lhes outras perspectivas, daí que não espante o desejo actual de abordar o fado e a voz de Lina.

Para além da graciosidade e do despojamento que rodeia a sua voz, dos acordes cristalinos da guitarra portuguesa que nos remetem para o fado, existe também um certo ambiente e balanço africanizado, como se o duo tivesse ido também à procura das origens e ligações entre fado e África.

É um álbum que, como se ouvirá, coloca a poesia de Camões em cenários de melancolia e suspensão, mas também de celebração da existência. Na concepção sonora, em estúdio, a rodear a voz de Lina, esteve a guitarra portuguesa de Pedro Viana, o piano, teclas e arranjos de John Baggott, músico e compositor que já operou com os Massive Attack ou Portishead, e também, em dois temas, Ianina Khmelik, no violino.

Na digressão que terá início em Fevereiro do próximo ano, a acompanhar Lina, em voz e sintetizador, estará Pedro Viana, em guitarra portuguesa, bem como Ianina Khmelik, em violino, piano acústico e sintetizadores, prevendo-se que John Baggott também esteja presente em algumas datas.

É um novo capítulo que se começa a escrever. Camões está no seu horizonte com uma sonoridade renovada, onde o centro é ainda e sempre a sua expressividade vocal, sensorial, latejante, cheia de vida para nos tocar.